“Eu perdi dois pedaços de mim e clamo a Deus por justiça”
O calendário marcava 13 de janeiro de 2021, o ano estava apenas começando e, como toda família unida, os sonhos estavam sendo planejados. Era segunda-feira, aparentemente um dia normal para a rotina da família de Alessandra Dias, do Rio de Janeiro, que ainda no domingo (12) tinha passado o dia todo na praia, como era de costume em todos os finais de semana de sol.
Moradores da comunidade de Cerâmica, em São Gonçalo/RJ, cinco filhos meninos e a felicidade presente em cada risada e desentendimento entre irmãos, em cada frase mal formulada do caçula, de apenas 2 aninhos, que ainda aprendia a correr, brincar e falar. Aquele dia teve início com o pai indo trabalhar e a mãe tirando os cinco da cama e preparando o café da manhã em família. A programação já estava pronta: tomar café, estudar, almoçar, ajudar nos afazeres da casa, jogar no celular e assistir ao filme da Sessão da Tarde, como sempre era feito. Tudo ia muito bem, até que ao terminar o filme, o filho mais velho, Kauã de 14 anos, pediu a mãe para deixá-los sair à rua brincar num campinho. “O dia estava lindo, eles tinham ficado o dia todo dentro de casa e eu resolvi deixar que fossem se divertir lá fora”, relembra a mãe Alessandra.
A brincadeira estava muito legal, vizinhos acompanhavam a alegria dos cinco meninos jogando bola e soltando pipa, rindo e comemorando suas manobras. De repente, os gritos de socorro ecoaram em toda a redondeza e o desespero tomou conta: um fio de alta tensão havia se soltado do poste e atingido Kayo, de 2 aninhos. Desesperado, e com o instinto de protetor que sempre teve, o irmão Kauã, de 14 anos, não pensou duas vezes e correu para ajudar o bebê. Ambos receberam uma descarga elétrica que interrompeu seus sonhos, cessou suas risadas e colocou fim em suas vidas.
A situação de perigo iminente já tinha despertado a preocupação de moradores, que reiteradamente e sem sucesso cobravam soluções da concessionária responsável (Enel).
A mãe, como numa premonição, sentiu um calafrio no momento exato do acidente. Mal sabia ela a notícia que iria receber: seus filhos estavam mortos.
Dizem que quando uma mãe perde um filho, todas as mães perdem também. Um amigo chegou na casa para chamar os pais dos meninos e aquela notícia ainda não sai da cabeça da mãe, que foi correndo ao local e avistou de longe seus dois meninos estirados ao chão. Ela foi retirada da cena, e se quer teve forças de fazer o reconhecimento dos corpos junto ao IML. “Eu pensei que eles tinham se machucado, coisa de criança, que a gente faz um curativo e resolve. Mas cheguei lá e vi uma cena que eu não desejo pra ninguém. Ao fechar os olhos eu me lembro de tudo como se fosse hoje, de eu ver meus filhos sendo eletrocutados e eu não poder fazer nada”, lamenta.
A VIDA APÓS O ACIDENTE
Não há mais alegria, tampouco vontade de sorrir. É como se um pedaço do coração da família tivesse sido arrancado. “Imagine Deus lhe dar cinco filhos, meninos lindos e saudáveis, cheios de vida. Quando você vai dar um beijo de boa noite, você conta e estão faltando dois. Eu só queria poder voltar no tempo e ter meus filhos de volta”, emociona-se Alessandra.
A vida tornou-se amarga. Não bastasse a carga emocional, a situação financeira da família passou a ser precária. Sem condições de ficar morando no mesmo lugar da tragédia, dona Alessandra, o esposo e os três filhos mudaram-se imediatamente para a casa da sogra de Alessandra e, depois de um mês, para outra casa, bem menor e que pagam aluguel. O pai ficou desempregado, passando a trabalhar informalmente. Com seis meses de aluguel atrasado, a geladeira estragada e sem dinheiro para consertar, a família “sobrevive” com o pouco que o pai recebe e com a caridade de parentes, até para o básico. “Perdemos tudo. Nossos filhos, em fase de crescimento, acordam e eu não tenho nem o leite pra colocar na mesa. Vejo que eles sentem fome e eu não posso dar a eles o alimento. Vivemos nessa casinha, e nada é mais como era antes. A gente até tenta, mas a tristeza e a sensação de impunidade não nos deixam. Não fazemos mais o que gostávamos de fazer, nem temos como fazer e tentar seguir em frente”, desabafa a mãe.
DEUS ENVIOU UM ANJO PARA NOS AJUDAR
Foi através da Associação Brasileira de Eletricistas (ABE) que dona Alessandra conseguiu ver uma luz no fim do túnel. Um anjo, chamado Dr. Prudêncio se sensibilizou com a história, abraçou sua causa e está sendo seu porto seguro. Mas a luta é árdua e toda a ajuda é necessária. Enquanto conta com esse apoio, a família tenta restaurar forças para buscar por justiça, enfrentando a lentidão de um processo. “Nada vai trazer meus filhos de volta, mas eu sonho em poder dar uma vida melhor para os outros três que ficaram comigo. Os cinco brincavam juntos, e eu agradeço a misericórdia de Deus que poupou a vida de três”, reflete a mãe.
SONHANDO EM SAIR DO ALUGUEL E MORAR NO QUE É SEU…
Além de ver a justiça sendo feita, a família anseia em sair do pesadelo do aluguel e conseguir comprar a CASA PRÓPRIA. Poder ter uma casa com espaço adequado para retomar a vida e amparar os outros três filhos é o desejo de dona Alessandra, que espera realizar com a AJUDA de quem consegue compreender sua angustia como mãe. “O que tocar no coração de cada um que está acompanhando nossa luta, para nós já é uma grande ajuda, pois não estamos recebendo assistência nenhuma da cia elétrica que deveria estar sensibilizada pela nossa dor. A ajuda foi negada com a resposta de que o culpado pelo acidente foi o meu próprio filho menor, que arrebentou o fio com a pipa. Isso me machuca muito, porque eu sei que um bebê de 2 anos nem conseguiria fazer isso. Eu perdi dois pedaços de mim e clamo a Deus por justiça”, conclui.